domingo, 9 de outubro de 2011

Um Sonho de Amor

Em uma rica mansão em Milão, Itália, um grande número de empregados uniformizados, eficientes e discretos está preparando um jantar especial. É o aniversário do patriarca da família Recchi, um magnata dono de uma rica tecelagem que carrega seu nome; com a idade avançada do Sr. Recchi, ele decide passar a empresa para seu filho mais velho, Tancredi (Pippo Delbono) e para o neto Edoardo (Flavio Parenti). Nos bastidores e calmamente comandando o jantar está Emma (Tilda Swinton), esposa de Tancredi, uma russa de nascimento que aprendeu, com o tempo, a se tornar italiana (o que, no mundo refinado dos Recchi, significa ser eficiente e obediente).

"Um Sonho de Amor" (no original, "Eu sou o amor"), sem exageros, é uma jóia rara. O diretor Luca Guadagnino produz uma obra elegante, extremamente ambiciosa e muito bela de se ver. A direção de fotografia de Yorick Le Saux é deslumbrante. Esta sequência inicial do jantar é filmada à meia luz, em tons quentes que contrastam com o cenário frio de Milão durante uma tempestade de neve. A sofisticação da direção de arte revela, a cada plano, os anos de tradição (e muito dinheiro) que existem naquela família. Ao mesmo tempo, percebe-se que algo não vai bem. O roteiro mostra, aos poucos, os pequenos dramas familiares que vão surgindo, como quando o patriarca se decepciona com o presente dado pela neta Elizabetta (Alba Rohrwacher, de "Que mais posso querer")  que, mais tarde, se revela homossexual. Ou o ciúme não declarado do irmão mais novo por Edoardo, claramente o preferido pela mãe. Para culminar a sequência, ela termina com a chegada de Antonio (Edoardo Gabbriellini), um cozinheiro amigo de Edoardo, que lhe traz um bolo de presente e é apresentado à mãe dele.

Um filme comum seria sobre o adultério de Emma e sobre suas consequências, mas este é um filme mais inteligente. Ele gira em torno das mudanças trazidas pelo tempo e pela sociedade sobre os personagens. Tilda Swinton sempre foi uma atriz excelente e é fascinante o modo como ela encarna o papel de Emma, uma mulher aparentemente sem passado que largou tudo para se tornar membro desta família italiana. A chegada da primavera traz novas cores ao filme e leva os personagens para as ruas, com consequências inesperadas. A revelação da homossexualidade da filha leva Emma a San Remo, onde Antonio, o cozinheiro amigo de Edoardo, planeja abrir um restaurante. Os dois iniciam um caso tórrido e inesperado, filmado por Guadagnino com grande beleza, em cenas passadas em meio à natureza. O relacionamento parece mais uma traição ao filho Edoardo do que ao marido de Emma, constantemente envolvido com a tecelagem e fazendo negócios em Londres.

Claro que a trama não vai acabar bem, mas, novamente, com que elegância o roteiro mescla a decadência familiar dos Recchi com os fatores externos, como a globalização, que vão tirar a tecelagem das mãos da família. Curioso também o modo como a sexualidade é retratada no filme, da frieza entre Tancredi e Emma para o calor de seu relacionamento com Antonio; do homossexualismo de fato de Elizabetta à insinuação de que a amizade entre Antonio e Edoardo poderia se tornar algo mais. Tudo culminando em um final apropriadamente operático, com tragédia, drama e romance resultando em uma emocionante cena de libertação. Imperdível. Visto como cortesia no Topázio Cinemas.

Câmera Escura

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